quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Luciana



Luciana Prado Queiroz da Fonseca tinha 25 anos quando se casou. Filha única de família rica e tradicional, frequentara os mais renomados colégios, aprendera a tocar piano e a fazer bico para o francês. Andava nos melhores carros e vestia as melhores e mais caras roupas. Era vaidosa. Desde criança ensinaram-lhe métodos infalíveis para disfarçar imperfeições faciais e jamais amarrotar a roupa. Era educada, embora economizasse simpatia com empregados. Aos 28 anos, seu marido pediu-lhe filhos. Tiveram dois meninos e uma menina, que foram educados conforme a tradição familiar. O marido não lhe negava caprichos e os filhos eram comportados e carinhosos. Formavam uma bonita família. Mas a felicidade não tinha espaço no cotidiano de Luciana. Os cuidados constantes e doentios com a aparência afastaram os filhos e o marido. Aos 42 anos, em uma das várias cirurgias de embelezamento, Luciana morreu. Deixou filhos pequenos, pais inconformados e marido rico. Luciana também não levou sua coleção de bolsas, seus sapatos italianos, suas jóias encomendadas e seu corpinho esculturalmente trabalhado pelos melhores cirurgiões do mundo. Luciana levou saudade e arrependimento. Mas descansou em paz. (pelo menos as rugas e as celulites ficaram).

C.S.S.

2 comentários:

  1. Este texto merece uma paráfrase com o de Cecília Meireles, "Retrato", principalmente neste verso:"Em que espelho ficou perdida a minha face?", isto é, em quais dos espelhos que tanto venerava Luciana ela deixou por perder sua felecidade, bem como si mesma, para apegar-se a uma ilusão...

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  2. eu diria que tem uma intenção bem óbvia. O texto não apresentou desafio algum, comentendo ao mesmo tempo (pra mim), um erro e uma proeza: o de se fazer claro.

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