domingo, 28 de setembro de 2014

a sociedade do estojo


parecia um estojo qualquer. nele havia lápis azuis e vermelhos, separados de forma organizada – cada um sabia exatamente a parte da gravura que requeria sua cor. 

ansiedade a cada lápis recém-chegado – o apontador – e a ponta logo revelada. o acolhimento pelo grupo era imediato e não tardava o início de suas atividades.

até que – não pode ser! – um lápis recém-apontado desapontou a sociedade do estojo.

à cor desconhecida deram nome de amarelo e disseram que ela não poderia pertencer àquele estojo, que certamente teria havido um engano.

o pobre amarelo – sem meios de se mudar de estojo – havia já se conformado com suas gravuras monocromáticas quando – subversivamente – um azul aventureiro se ofereceu para um dia de trabalho em conjunto.

a inexperiência do pobre amarelo – que não havia aprendido a respeitar os contornos da gravura – misturou sua cor com a do azul aventureiro e – não pode ser! – nenhum dos dois se reconheceu no serviço feito. à nova cor deram o nome de verde, mas o medo de represálias manteve a descoberta sob absoluto sigilo.

não demorou, contudo, para que o grande feito fosse descoberto por um vermelho curioso. temendo ser delatado, o azul aventureiro pediu ajuda do pobre amarelo – que ofereceu suas gravuras monocromáticas ao vermelho curioso para que ele não divulgasse a descoberta ao restante do estojo.

o vermelho curioso – que não era bobo nem nada – pegou as gravuras do pobre amarelo e – reafirmando que aquele estojo não era o seu lugar e objetivando ocultar o pobre amarelo – espalhou sua cor pelas gravuras monocromáticas e – não pode ser! – ele não reconheceu no resultado o seu vermelho e nem o pobre amarelo. à nova cor deu o nome de laranja e a condenou ao absoluto sigilo – quebrando as pontas do pobre amarelo e do azul aventureiro.

não demorou para que os azuis, solidários à ponta quebrada do aventureiro, decidissem aniquilar os vermelhos indesejados do estojo. durante a luta, várias pontas se quebraram e caíram sobre as gravuras ainda por pintar. o atrito das pontas quebradas sobre o papel – não pode ser! – havia resultado em uma nova cor – à qual deram o nome de roxo.

o sentimento de culpa pela quebra das tradições tornou-se, então, generalizado – e o que é geral não discrimina, ocultando-se sob o lenço do irrelevante.

ficou mais bonito! disseram todos os lápis do estojo, num coro colorido que gravura nenhuma colocaria defeito.

C.S.S., aprendendo a pintar 

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